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Curso FIC voltado para LBGT apresenta resultados. Veja entrevista na integra com Adriana Liário, representante do grupo LGBT de Rondonópolis

Publicado por: Campus Rondonópolis / 27 de Abril de 2018 às 16:48

O curso voltado para o público Trans de Rondonópolis, promovido pelo Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) – Campus Rondonópolis chegou ao fim no mês de abril. Mas os resultados superaram as expectativas, pois das 15 inscritas, apenas duas tiveram que parar o curso por motivos pessoais. E a mudança de vida que o projeto achava que iria encontrar apenas após a conclusão do curso, foi notado pelas próprias alunas ainda durante o curso.

A presidente do Grupo de Apoio das Travestis e Transexuais de Rondonópolis, Adriana Liario, em entrevista conta um pouco sobre essa experiência dentro do IFMT e as expectativas para o futuro das alunas que passarem três meses tendo aula no Instituto. 

IFMT – O curso está chegando ao fim, como você avalia estar no IFMT? Quais as barreiras que enfrentavam antes e que hoje superaram?

Adriana Liario - Quando nós tentamos fazer o Ensino de Jovens e Adultos (EJA) em outra escola pública de Rondonópolis tinha a barreira com relação uso do banheiro e do nome social. Tinha também o preconceito com os próprios alunos e professores, e ali no IFMT não vemos isso.

Não vemos as pessoas ficarem com a “Síndrome do Cotovelo”, que é cutucar a outra para chamar atenção quando passamos.

IFMT – E o que as outras Trans estão achando?

Adriana Liario - O que eu vejo, é que elas falam bastante sobre os últimos módulos ter entrado mais em assuntos que elas gostam, a carga horária foi reduzida até. Todas falam a mesma coisa -que queriam mais-, e todas estão se sentindo triste porque vai acabar.

E começaram então os questionamentos - Como vai ser depois? - E depois que acabar vamos voltar para rotina de novo? - Vai voltar para a mesma mesmice? E foi justo agora que começamos a pegar o ritmo.

O curso despertou em nós o que devemos fazer corretamente. Por causa da vivência na prostituição nas ruas tínhamos aquela visão fechada. E quando começamos a ir para a escola, nós paramos para fazer algumas pesquisas e olhar o mundo com outros olhares. E vimos que o mundo onde a gente está é um mundo limitado.

Então você não consegue as coisas que quer ali. E se a gente ir para os estudos, se formar, entrar no mercado de trabalho, vamos ganhar muito mais do que ganhamos na prostituição. Porque a expectativa de vida de quem vive nessa profissão, é de 29 anos para uma pessoa Trans.

E conversando entre nós mesmas, vimos que após os 29 anos a gente não é apta para a prostituição. Você trabalha enquanto é novinha, quanto mais nova na prostituição mais você consegue trabalho, mas quando chega nos 28 e 29 não é a mesma coisa, ficamos de escanteio. E quando passa dos 30 anos, você não trabalha mais. Então o curso abriu a nossa mente para esses detalhes.

IFMT – Você falou que agora estão olhando o mundo com outros olhares. Que olhares são esses?

Adriana Liario - Foram dois olhares, um do nosso lado e outro do Instituto. No primeiro dia houve uma ligação perguntando para mim: - Você já conversou com as meninas como vai ser? – e eu respondi: - Relaxa, somos travesti e vamos chegar quebrando tudo.

Mas quando chegamos lá vimos que não havia preconceito, e os alunos queriam nos acolher como pessoas ‘normais’ e fizeram até brincadeira quando entramos, cantando uma música feita por algumas LGBT’s. De início, achamos que era alguma provocação, mas logo percebemos que não. Que eles queriam de alguma forma se aproximar e dar boas vindas.

IFMT – Sobre o pós IFMT, vocês pesquisaram o que querem fazer?

Adriana Liario - O anseio nosso agora, pelo menos desse grupo, é terminar o Ensino Médio, pois a maioria não tem. Nós estamos esperando alguém falar alguma coisa para nós. E ficamos pensando: - Será que em outro local vai ser igual? E sabemos que não vai ser! Nós achamos aqui (IFMT) e temos a esperança que aqui continue.

IFMT -  Você não acha que dá para usar como exemplo esse curso que aconteceu no IFMT para abrir portas em outros lugares?

Adriana Liario -  Por isso que eu falo de ter a continuidade, de abrir outra oportunidade e um outro curso. Que não abra apenas para essas meninas, que tenha também em contexto geral!

A imagem delas foi para o Brasil inteiro no meio Trans. Na semana passada eu estava em um encontro, com a Rede Trans e Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), e lá levantei essas questões do que estava sendo feito aqui. E os comentários em todo evento, foi de como está acontecendo o curso.

Eu espero que tenhamos mais uma oportunidade, para ver como que está, se vai vir mais público. A gente sabe que estamos sendo a porta da entrada. Queremos saber como que fica agora? Essas travestis são as que estão na casa e vivem na prostituição, mas e as outras que vivem na cidade e estão fazendo outras coisas?

Essas meninas por estarem aqui, e o mundo ser a noite, não tem muito contato com outras pessoas.

IFMT  - O curso trouxe conhecimento e dá mais segurança. Você sentiu que as Trans que participaram do curso, se sentiram mais empoderadas?

Adriana Liario - Teve uma frase que apareceu no meio, que se diz assim ‘Não aumente a sua voz, melhore seus conhecimentos’. Foi lá dentro da própria casa, que houve essa mudança. Lá dentro haviam muitas discussões, e agora não tem mais uma jogando pontinho para outra. Hoje em dias elas sabem pedir ‘com licença’, dar ‘bom dia’. E tudo isso aprendemos no curso, de não acordar com a cara fechada, e tratar bem as outras pessoas. Melhorou totalmente o clima da casa, todas nós mudamos.

IFMT  -  E fora da casa, como vocês estão sendo vistas?

Adriana Liario - No bairro inteiro houve mudança. Tem dois anos que estamos ali, e ai, antes de chegar lá, os vizinhos já falavam que ia ser só bagunça por ser travesti. Falavam muitas coisas negativas. E depois que o Instituto começou a nos buscar com o ônibus, eles vieram falar que estamos dando uma lição para eles, pois achavam que nós éramos uns monstros e hoje veem que somos diferentes.

A convivência das meninas com os vizinhos mudou totalmente. A forma de conversar, de postura, comportamento, de vestimenta... Essa última parte era complicada, pois para sair de casa, nós tínhamos que sair de táxi e voltar de táxi por causa da vestimenta. Hoje em dias elas sabem se vestir, então ela saem com uma roupa, e lá onde elas tem que trabalhar, colocam a roupa de trabalho. Quando voltam, vestem uma roupa comportada novamente.

Ficou bem visto para nós, como para outras pessoas!

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